minutos permanentes

28 de abril de 2012 § 4 Comentários

Ela disse que te viu por ai um dia desses, na padaria.

Eu até imagino o reencontro, seus olhos doces enfrentando o azedume do olhar dela. Se apaixonaram enquanto eu estive fora, durante todos esse anos? Vocês combinam, e sabem disso. Combinam de um jeito absurdo, assustador e esquisito, de um jeito tão abominável que chega a ser gracioso. Eu sabia que no fim ia ser assim, um esbarrão casual no supermercado, na lanchonete, na avenida… Uma troca carinhosa de olhares, de experiência, de vida. Uma noite juntos e pronto – vocês nasceram um para o outro. Você não gostava do cheiro que ela tinha. Você gosta agora?

É engraçado porque o tempo passa, as pessoas passam, e a gente continua a mesma coisa. Mesmo crescendo (não fisicamente, claro – ainda tenho a entrada permitida em brinquedos de criança e calço sapatos com numeração infantil),  mesmo mudando, no fundo só a mesma adolescente bobinha que cora quando você sorri. Você ainda é dono daquele sorriso. Você ainda é responsável pela vermelhidão. Você ainda me faz passar a noite imaginando como seria, ainda me faz brigar com ela por sua causa, ainda me faz vir até aqui e escrever bobagem, derramar nas páginas as palavras que eu não capaz de te cuspir na face. Eu te transformei em tanto personagem bandido, te fiz senhor de tanta paixão, dono de tanto coração. Ler um conto da Lygia e me enxergar ali, na pele da mulher alienada que se apaixona pelo modo como ele corre os dedos pelos cabelos escuros e ouvir John Mayer pensando que a letra se encaixa como que feita sob medida me arranha, eu me sinto um disco antigo que repete a mesma faixa incessantemente – você usava o cachecol? Usava o mesmo perfume? Um casaco azul escolhido ao acaso ou a blusa que tinha significado especial? Jogou aquela touca fora ou ainda desfila pelas ruas parecendo um mamão de feira? (Acho que aprendi a gostar de mamão. Mas isso não tem nada a ver com você)

E em cada detalhe você ficou. Em cada abraço não dado, e naquele último que foi o primeiro, eu queria apenas lembrar quais as palavras exatas, mas a memória me falha e talvez seja para o bem. Você foi um babaca. E depois foi um doce. Não necessariamente nessa ordem. Você usava seus olhos como objeto de caça – helicópteros de caça. Você estava menino, e agora deve estar um homem – mas eu queria que mantivesse a voz. Ela disse que foi educado, polido, distante. Ela disse que ainda andava de maneira impecável; disse que lhe deu um beijo no rosto e saiu depressa, tinha que ir trabalhar. E eu achei que você viveria às custas da riqueza do pai eternamente.Você faz o quê? Vende promessas? Eu talvez precise de mais algumas. Eu talvez precise de um adeus honesto, um adeus eterno, que acabe tudo, entende? Eu talvez te precise um pouco, por minutos permanentes. Talvez.

ps: eu não vou rasgar nem deletar nada que te envolva, você não tem direitos sobre o que me deixou, nem mesmo sobre as lágrimas e cicatrizes.

ps2: e eu só não te detesto porque você me deu coisas demais para amar. E o jeito como você se move é injusto, você sabe.

ps3: se um dia vocês dois se casarem, eu os processo por plágio. Já tinha escrito uma história assim há muito tempo.

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